sexta-feira, 26 de setembro de 2008
Casa Sombria (A Solidão)
Naquela estranha noite de Dezembro o frio entrava pelas janelas da casa abandonada sem que alguém pudesse encerrar de vez as portas e janelas abertas à madrugada. Não havia ninguém dentro da casa, há muito que era apenas um sítio perdido no meio de um pequeno vale; a água que escorria pelos seus canos, em pequenas pingas, era podre da cor do tédio, acizentada por tanta podridão que continha, há muito que a vida morrera ali. Pequenas ervas cresciam de encontro às paredes, ervas daninhas e grossas, como se fossem cascos de árvores a quererem erguer-se do fundo de um poço, ervas altivas, crescidas, com sangue por entre a sua cor verde, ervas de morte e de assombro. Tudo estava morto ali dentro, não havia réstea de vida por entre os quartos, outrora habitados por corpos esguios e sorridentes, famílias abrasonadas e cheias de sonhos de riqueza. Sentia-se o cheiro a solidão, o estranho cheiro das coisas paradas, da perseguição mal explicada, dos fantasmas vestidos de negro para não serem notados na noite. Lá longe ouvia-se o canto de uma coruja acordada fora do tempo, com os seus olhos brilhantes abertos à noite, e com o seu piar frio, distante, ausente...como se tudo o que estivesse diante dos olhos existisse mas não pudesse ser explicado. Havia um antigo relógio junto a um armário fechado, um daqueles relógios de grandes ponteiros, prontos a marcar as horas de minuto a minuto como se fosse um condenado no corredor da morte, tic tac tic tac...repetidamente, sem fazer pausas, era o único objecto vivo dentro daquela casa que a vida se esquecera de visitar. As telhas estavam repletas de fendas e quando chovia a casa parecia uma pequena catarata sem rochedos, pronta a que qualquer corpo se viesse lavar. Mas nunca ninguém apareceu, a casa manteve-se sempre sozinha com as suas ervas, o seu relógio, o seu tempo, a sua noite...a vida não sabia a sua morada.
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