No plaino abandonado
Que a morna brisa aquece,
de balas trespassado
- Duas, de lado a lado -
Jaz morto e arrefece
Raia-lhe a farda o sangue
De braços estendidos,
Alvo, louro, exangue,
Fita com olhar langue
E cego os céus perdidos
Tão jovem! Que jovem era!
(agora que idade tem?)
Filho único, a mãe lhe dera
Um nome e o mantivera:
"O menino de sua mãe"
Caiu-lhe da algibeira
A cigarreira breve
Dera-lhe a mão. Está inteira
É boa a cigarreira.
Ele é que já não serve
De outra algibeira, alada
Ponta a roçar o solo,
A brancura embainhada
De um lenço...deu-lho a criada
Velha que o trouxe ao colo
Lá longe, em casa, há a prece:
"Que volte cedo, e bem!"
(Malhas que o império tece)
Jaz morto, e apodrece,
O menino de sua mãe.
Fernando Pessoa
Devolve-me o meu filho! Entrega de novo esta criança aos meus braços, ao meu afecto. Não sabia que eras ladra, mas já roubas tantas vidas, que diferença te faz a do meu filho? Porque me roubas a única coisa que eu tenho? Quero o meu filho de novo em mim, quero o meu filho vivo! Ao longe ainda ouço tiros... mais mães que ficam sem os seus meninos, mais lágrimas na cara do mundo, mais vergonha na cara dos homens. Que um tiro trespasse todos estes que matam os filhos dos outros, pobres inocentes que apenas têm por destino a morte desde pequenos, que a mesma "sorte" que o meu filho teve caia em cima deles. Ainda ontem o tinha nos braços, ainda ontem ele me dizia o quanto gostava de mim e eu o acariciava lentamente enquanto ele sorria para mim...nunca mais vou ver o sorriso do meu filho (nem o meu). A pouca alegria que ainda restava em mim vai com o sangue do meu filho que entra agora na terra que o viu nascer, o sangue vai descendo pela rua lentamente, como se fosse um rio impuro onde ninguém tem a coragem de ir beber. Nenhuma mãe devia assistir à morte do seu filho, é contra natura, é contra tudo aquilo que sempre nos disseram, é contra nós! Nós vivemos para ver os nossos filhos viver e para eles nos verem a partir, que estranha condição é esta dos nossos filhos nos morrerem nos braços? Onde é que está escrito que isto é possível? Quem inventou isto? Não me venham falar em Deus! O meu filho está morto nos meus braços, há explicação para isto? Era por ele ser mau? Ele tinha oito anos! Oito! Que criança é má com esta idade? Não me tentem consolar, devolvam-me o meu filho! Isso sim! Ou pelo menos tenham a piedade de me levarem com ele, onde estão esses homens com armas no punho? Que me matem também a mim! Que trespassem este meu corpo de balas! Levem-me para junto do meu filho! Se existes, Deus...apenas um pedido...põe-me ao lado do meu filho...já!
quarta-feira, 27 de agosto de 2008
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