terça-feira, 26 de janeiro de 2010

lobos...

mataram um lobo no alto da serra.
ainda hoje ninguém sabe quem tem as mãos manchadas com o sangue do animal, quem foi teve o cuidado de não deixar marcas.
as pedras, manchadas de sangue, ainda choram pela vida de quem conheciam.
nunca mais houve cantos nocturnos pelo resto da alcateia, fez-se o silêncio que é costume existir nos funerais.
tudo foi feito como se se tratasse de um ritual, sem lágrimas e com silêncios.
ninguém foi à procura do Homem que disparou contra o animal, o assassino pouco interessa quando a vítima já está morta e sem hipótese de solução.
o sangue faz correr sangue.
é como um rio que não sabe nunca quando parar.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Venho Falar Dos Meus Medos

as crateras que se abrem no coração são buracos que não têm fim, tal qual uma ferida aberta que não sabe quando pode estancar o sangue que por si corre. o homem estava ferido por balas que já não pertenciam a ninguém, apenas ao seu corpo, e contudo ainda conseguia manter um sorriso no rosto, como se tivesse estado desde sempre à espera daquelas balas no seu corpo. teve a certeza de que viu a cara de deus por entre duas nuvens, tinha uns dentes brancos como nós nunca tivemos e um sorriso que não se consegue explicar por palavras, há algo de metafísico nos momentos que antecedem a morte de alguém, e também um certo olhar de emergência no rosto dos aflitos. não sei porque falei no rosto dos aflitos, e também não sei como é que este homem, ou qualquer outro, pode falar dos seus medos. talvez escondidos nas grutas da nossa vergonha, talvez nesse sítio se possa contar aquilo que aflige um coração. não há estórias de embalar nos países onde a morte passeia à rédea solta, não há sequer tempo para contar qualquer história. o tempo mata-nos e fatiga-nos, por vezes podemos sentir a coragem de o matar, mas logo nos acobardamos para nunca mais voltar sequer a mostrar a nossa cara perante os outros. escondemos o rosto por entre as mãos e choramos, choramos lágrimas de vida, e por vezes há restos de saudade por entre as lágrimas que nos caem, há estilhaços do que fomos e daquilo que ainda viremos a ser, somos tanto nos momentos em que nos sentimos tão pouco. não sei porque razão temos os nossos medos e nem sequer a razão porque este texto começa com a imagem de um homem baleado, talvez as balas sejam a simbologia da repulsa que sentimos por cada arma que ainda consegue disparar. as palavras ainda são uma arma, letal, acreditem. apontem as palavras, façam pontaria, por vezes elas matam mais depressa.

domingo, 3 de janeiro de 2010

What a Dump!!

Parti os copos todos mal o jantar acabou, o pior é que cortei a mão.
Não sei o que me deu mas depois de um jantar daqueles tinha de explodir para algum lado e os copos eram o que estava mais à mão. Depois deitei-me no sofá e deixei-me adormecer, fiquei a pensar no que fazia à minha vida depois das conclusões a que todos tinhamos chegado e não cheguei a nenhuma conclusão. Ao menos não chorei, a idade começa a fazer de mim uma pedra que teima em não quebrar, ou então o impacto não foi suficientemente forte. Devia ter partido os pratos também, ao menos não ficava com recordação nenhuma deste maldito jantar, só podia ser ideia minha a de juntar tanto imbecil nuns simples dez sete metros quadrados. Levantei-me do sofá e fui até à cozinha para ver se ao menos teriam tido o bom senso de me deixar qualquer gota de vinho que me podesse aliviar o peso da noite, claro que os cabrões não me deixaram nada que não fosse umas míseras garrafinhas de água, e mesmo assim algumas estavam abertas. Fui até ao armário e tirei a caixa dos chocolates de ginja, não ia deixar o meu estômago à procura de álcool quando lhe era tão essencial para a sobrevivência. Encostei-me ao lava-loiça e aí sim comecei a soltar umas lágrimas, pior foi quando cheguei à porta da sala e reparei no cenário devastador que se apresentava à minha frente, parecia que a terceira guerra mundial tinha começado mesmo ali, na minha sala. Até uma mesa pequena, herança da minha avó, estava do avesso, de pernas para cima, como se estivesse à espera que alguém a desflorasse na flor da primavera. Algumas molduras também estavam partidas, mas isso eu até agradecia pois as fotografias apenas servem para aumentar o sofrimento de quem não esquece o que ficou para trás. Não sabia por onde começar a arrumar, também não tinha a mínima vontade de o fazer, apenas tinha a sensação de que tinha de sair dali, fugir para bem longe, onde a confusão não existisse e apenas ouvisse a minha respiração. Deixei-me cair parede abaixo, faltavam-me as forças para tudo, até para sair de casa, claro que ouvia o som da minha respiração, ofegante como estava só um surdo a não iria ouvir. Tirei os sapatos e fiquei a olhar para os meus pés, engraçado como as unhas demoram tão pouco tempo a crescer, deve haver uma explicação qualquer para esse facto, mas não era altura para estar a pensar nas minhas unhas. Levantei-me, ergui-me, respirei e avancei frente à cozinha, peguei na maior faca que consegui encontrar e por breves momentos consegui alcançar a felicidade.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Vagamundo

Já disse adeus a tanta terra, a tanta gente,
Nunca senti meu coração tão magoado,
Inquieto por saber que o tempo vai passar
E tu vais esquecer o nosso fado

Partidas,
(Cada vez mais sombria, cansada),
São nuvens negras em céu azul,
São ondas de naufrágio em mar fundo.
No meu deserto não vejo abrigo
Sem ter um amor neste mundo

Mas se eu voltar e como penso me esqueceste,
Troco por outro o coração amargurado.
Tentarei não fazer mais castelos no ar
E nunca mais viver outro fado

Luís de Macedo